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Depois do Estado-nação

 

Deparamos, desde a aparição do Isis, uma mudança, sem volta, da noção da convivência que pede a humanidade contemporânea. Enfrentamos o abandono do entendimento dos Estados nacionais como atores das guerras do século XX. No quadro dos conflitos, de toda forma, sempre se presumia a irrestrita convivência internacional. O que se observa, agora, é a negação radical dessa premissa, com a emergência do Estado Islâmico, o definitivo abate de toda ideia desse mesmo Estado nacional e a afirmação do califado, radicalmente excludente e dominador. 

Despontam as novas diásporas, implicando, nessas distintas migrações, a saída das populações ameaçadas de extermínio pelo Isis; as explosões no Meio Oriente de um terrorismo errante; as rupturas pontuais, como a do Turcomenistão, Afeganistão ou Paquistão, numa quebra radical com o status quo político desses países. Pergunta-se, ainda, se as novas levas, crescentes e maciças, de travessia do Mediterrâneo aos países europeus representaria um êxodo continental da miséria, na percepção, sobretudo africana, da busca, sem volta, da afluência. E tal, mormente, em Estados recém-constituídos, após a superação do colonialismo, e, talvez, nostálgicos da melhoria social relativa e condicional no quadro das antigas dominações.

Na América Latina, é o Brasil que enfrenta, de saída, essas novas diásporas, marcadas pelo afluxo crescente de haitianos em nossas áreas fronteiriças. A interrogação que emerge é a de sabermos se iremos à efetiva assimilação, com a outorga da naturalização sistemática ou com o status de dupla nacionalidade aos nossos vizinhos. 

Assistimos, nos últimos meses, a uma radical reformulação da perspectiva europeia no recebimento desse influxo, pelas suas principais economias mais abastadas. E impressiona como, após a primeira retração, passamos essas semanas a uma explosão de acolhida na Alemanha, na França e, agora, na Espanha. O que começou com o Isis pode pôr à prova, a prazo curto, o repto de fundo, que começa com as miríades de barcos no Mediterrâneo. Levarão tais diásporas, a seu tempo, a uma reação, pela defesa das identidades locais, ou, tardiamente, às políticas pós-nacionais de redistribuição de renda, em escalas realmente continentais, e sem volta?

Jornal do Commercio (RJ), 18/09/2015