Viraremos o ano com as intermináveis denúncias de corrupção da Petrobras, acrescidas do inventário dos dinheiros desviados, num somatório que já não comove mais o imaginário coletivo. Teríamos chegado ao teto da possível indignação cívica que comporta a nossa cultura. Não obstante, fica a indagação: se antecipado o conhecimento desse tsunami, comprometer-se-ia de vez a reeleição de Dilma? De toda forma, já se esteriliza o aguardo de novas revelações no labirinto dos desmandos da nossa maior empresa.
Vai ao fundo do que seja, hoje, a nossa cultura cívica, nesse contraponto entre os facilitários da delação premiada e o que representou a lealdade às suas convicções na resistência, por exemplo, dos torturados diante dos regimes militares.
De toda forma, chegou-se no basta de Dilma, mantendo Graça Foster na presidência da Petrobras, ao dique final, do nível ao contágio das denúncias. Haveria a falar, até, em defesa do patrimônio público, que representa a crença – ou princípio – na ação do governo, e a presunção do bem comum na administração saída fresca das urnas.
A ladainha, hoje já monótona, pode levar também ao prêmio da redução de prisão, para a fieira que ora se engrossa de novos pretendentes à negociação de seus segredos. Modifica-se o cálculo do “abrir a boca”, animado pela gula inicial de Paulo Roberto Costa.
Em termos de opinião pública, saciou-se o país com o cenário inédito da prisão dos milionários, na saída dos seus helicópteros diretamente para o colchão, no raso das cadeias. Atendeu-se, dentro dessa mesma cultura cívica, ao que a sociologia política chama de “civilização do espetáculo”, na satisfação do nosso inconsciente coletivo. E, de pronto, iremos às anistias amplas, no que ensejam a inauguração de um novo governo e a retórica das “viradas de página”. Essa expectativa vai certamente ao champagne, neste fim de ano, à espera dos super-ricos, ainda atrás das grades.
Soma-se aí, na contramão das prisões e do ineditismo do juiz Moro, a corrosiva indulgência do país cordial acentuada pelo espírito natalino, no descarte da memória para todos os perdões.