Entre as notícias de crise no mundo inteiro, com os Estados Unidos comandando os receios de recessão, o Ipea e a Fundação Getulio Vargas trazem as boas notícias de que a classe média já é maioria na população brasileira, chegando a 51,89% das pessoas, e que 3 milhões de brasileiros deixaram a faixa da pobreza absoluta. É uma importante etapa vencida e uma grande mudança, causada pela queda do desemprego, pelo aumento do número de trabalhadores com carteira assinada, pela melhoria do salário mínimo e pelos grandes programas sociais.
Como a unanimidade não existe - parafraseando o nosso sempre lembrado Nelson Rodrigues, de irresistível memória - alguns economistas de uma universidade do Rio de Janeiro reconhecem que houve melhoria de renda, mas afirmam que o processo de aferição dos números divulgados não é tão confiável.
Vamos ficar com o bom senso e reconhecer que, com métodos de pesquisa confiáveis ou nem tanto, a vida melhorou e a melhor pesquisa está nos nossos olhos. A demanda aumentou, come-se melhor e cada vez mais gente ingressa no mundo da sedução dos anúncios de produtos sofisticados, outrora fora do alcance das pessoas. Lula agora colhe o que plantou.
Fala-se numa nova classe média, a exemplo do que Clinton diagnosticou, ao designar como nova economia o advento da bolha das companhias pontocom. E então somos chamados a pensar o que essa mudança significa para o Brasil. Primeiro, viramos um país de classe média, como sentenciou um grande jornal brasileiro. Segundo, a classe média sempre foi uma força social e uma alavanca para insatisfações e desejos. Seu primeiro sonho, ao ganhar mais dinheiro, é render-se ao consumismo hedonista e incorporar a seus hábitos celular, carro, viagens, grifes e toda essa parafernália milagrosa que é anunciada nas polishops. Outro sonho é possuir uma conta bancária que desfrute de status especial, fora da vala comum dos depositantes que são perseguidos pelo vermelho. Para não falar daquele que é um dos hábitos históricos da classe média: malhar o governo.
Mas com a diminuição das classes D e E, a boa notícia também chega para os ricos, que cresceram em número de 11,61% para 15,52% da população e passam a sonhar, não com carros, mas com lanchas e temporadas de esqui nos Alpes Suíços. Pelos dados divulgados da economia, estamos no melhor dos mundos. Mas não soltemos foguetes. Os números dizem muito e mostram pouco. Escondem o flagelo da insegurança, o medo da sociedade acuada pelos bandidos e o desespero das filas da saúde. O passaporte definitivo para o bem-estar e para o desenvolvimento de nosso país passa pela educação e pelo melhor consumo de cultura.
Jornal do Brasil (RJ) 8/8/2008