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A China e a verticalização

 

As brumas começam a dissipar-se. O claro-escuro das eleições desaparece. Toda a área política estava imobilizada e sem estratégia porque a regra que mais afetava o processo eleitoral ainda não estava definida: a verticalização. Essa palavra e esse fantasma passaram a surgir no vocabulário político a partir da última eleição. E surgiu como uma bomba quando o Tribunal Superior Eleitoral determinou que os partidos tinham que casar no civil e no religioso, isto é, nacionalmente e no âmbito estadual. Foi uma confusão dos diabos e só serviu para tumultuar as eleições e criar todas as infidelidades.


Ontem, a Câmara dos Deputados deu a largada na sucessão e, já no fim da noite, as conversas políticas e as seduções de alianças estavam a todo vapor.


Daqui a dois dias, domingo, dia 29 de janeiro, começa o Ano Novo chinês, conforme o seu calendário, baseado no ciclo lunar com meses de 28 dias. A folhinha deles tem motivação histórica e remonta ao mítico imperador Amarelo, que fundou a civilização chinesa e estabeleceu um tempo comum, assim como o papa Gregório 13, que fez o nosso calendário.


E como lá cada ano começa com um signo baseado nos bichos, este será o Ano do Cachorro, que também governará, embora da China, o nosso ano eleitoral. Dizem lá que é o ano da família, porque o cachorro é de casa e do chão, amigo das pessoas e possibilitará aos pobres chineses do campo, mais apegados às coisas da astrologia, compreender melhor a vida de cachorro que levam.


Se nossos políticos quiserem o palpite do ano, as cores melhores e mais chamativas para as camisetas dos eleitores serão amarelo, ocre e bege.


Mas a China comemora o ano com uma excepcional vitória: seu produto interno bruto (PIB) cresceu 9,9% e passou os da Inglaterra e da França, situando-a em quarto lugar na corrida das economias mundiais, com uma cifra de US$ 2,26 trilhões.


É o chamado milagre chinês, que não é milagre nenhum, mas uma planejada e bem-sucedida política concebida por Deng Xiao Ping, a "economia socialista de mercado". Esse modelo, que fez da China um "global player", teve início nas zonas de processamento de exportação, as ZPEs, que eu tentei implantar no Brasil e não pude porque houve uma grande reação de setores do nosso empresariado, aqueles que têm a mentalidade de um capitalismo sem risco e sem concorrência.


Os chineses descobriram um caminho de êxito, e seu crescimento é constante, no princípio com passos pequenos e, nos últimos tempos, na faixa de 10% ao ano.


Ninguém duvida mais de que em poucos anos a economia chinesa irá alcançar a americana. Aí teremos uma luta de gigantes, não digo ursos porque na China tudo tem símbolo, e as relações EUA e Pequim têm como emblema o urso panda, que está em extinção, mas, para eles, vai ser preservado, assim como a relação entre os outrora inimigos e hoje parceiros.


Tomara que este ano, para nós, que não temos bichos no calendário, não seja um ano de cachorro, candidatos mordendo candidatos, pitbulls e rotweillers. Até mesmo porque, se assim for, já 4.704, o próximo ano, será o Ano do Porco e ficará muito feio os eleitos serem acusados de uma campanha porca.


Vivam a derrubada da verticalização e o Ano do Cachorro!


 


Folha de São Paulo (São Paulo) 27/1/2006