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Biden hoje, Lula amanhã

 

O Brasil, como todo o mundo, tem razão em se preocupar com o embate Biden-Trump nos EUA. Mas faria bem se começasse a atentar para o que o espera na sua própria praia em 2026: um presidente mais velho, talvez longe da melhor forma, tentando a reeleição contra um expoente da extrema direita vendendo vitalidade, dominando todos os truques sujos e sem escrúpulos em usá-los. Refiro-me, evidente, a Lula contra um preposto de Bolsonaro, inelegível até 2030 mas em condições de se fazer representar por esse preposto e repassar-lhe seus votos.

As semelhanças são muitas. Biden, que é de novembro de 1942, assumiu a Presidência dos EUA aos 78 anos, em janeiro de 2021. Lula, que é de outubro de 1945, assumiu a do Brasil aos 77, em janeiro de 2023. Biden, se reeleito este ano, assumirá o mandato com 82 anos e o terminará em 2028, com 86. Lula, se reeleito em 2026, assumirá com 81 e terminará, em 2030, com 85. Nesta fase da vida, um ano de diferença não faz de Lula um garoto diante de Biden. O risco não está só em como eles se apresentam hoje, embora isso já pareça mortal para Biden, mas em como estarão, física e mentalmente, ao fim de um segundo mandato.

Biden fala fino e parece tíbio. Lula fala grosso e com autoridade. Mas os dois têm uma rouquidão que pode incapacitá-los em palanques. Biden nunca teve doenças sérias, mas sofre de artrite espinal, tem uma neuropatia nos pés e já aparenta confusão e desligamento em momentos. Lula parece bem —para quem teve um câncer de laringe, em 2011, e duas Covids, em 2020 e 22.

Assim como Trump (só oito meses menos que Lula) não perde uma chance de se pavonear perante a fragilidade de Biden, o adversário de Lula, seja quem for, poderá tentar fazer o mesmo com ele.

Biden e Lula têm em comum não estarem dispostos a fazer sucessores. Dinastias que começam e terminam com seus titulares não vão muito longe.

Folha de São Paulo, 03/07/2024