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Um livro diferente

 

O livro de Célia Labanca é, até certo aspecto, raro. Na verdade, é um livro binário. Há um texto de ensaio e, depois, a parte romanceada.

Não é livro feito às pressas. Vê-se a reflexão e a pesquisa, na parte inicial, e percebe-se o esforço da trama, na outra vertente. Tanto na reflexão, quanto no esforço, é patente que a autora insiste em cultivar a palavra.

Célia Labanca está incorporada à galeria das brasileiras escritoras, nomeadamente daquelas que têm Pernambuco como lugar de nascimento, ou de vida, ou de inspiração.

Não evito recordar as pernambucanas escritoras, que temos ou tivemos na Academia. O pioneirismo de Edwiges Sá pereira, líder feminista, professora, fundadora da Federação pernambucana para o Progresso Feminino,

1931. A obstinação em servir à APL de Dulce Chacon, educadora e grande figura humana, com quem tive a honra de conviver. E mais: Maria do Carmo Tavares de Miranda, Fátima Quintas, Lourdes Sarmento, Lucila Nogueira, Maria do Carmo Barreto Campelo, Isnar Moura, Maria Cristina Cavalcanti de Albuquerque, Luzilá Gonçalves entre tantos outros nomes.

Nem deixo de lado o protagonismo feminino de Rachel de Queiroz, na Academia Brasileira de Letras. Dela e de Lygia Fagundes Telles, Ana Maria Machado, Nélida Piñon, Zélia Gattai Amado, que só elas já explicariam a relevância da instituição, sem precisar do contingente masculino. Não apenas se destaquem as mulheres na Academia, pois há igualmente figuras que não foram incorporadas à imortalidade, nem por isso menos dignas do maior respeito. Nomes como Lelia Coelho Frota, Neide Archanjo, Lia Luft, Maria Beltrão, Bela Josef, Laura Sandroni, Isabel Lustosa, Maria Clara Machado, por exemplo. Essas são companheiras de Célia Labanca.

O leitor encontrará nas páginas do livro uma autora comprometida na percepção e no uso responsável da palavra. Seu empenho nesse objetivo é mais do que claro. É explícito.

Célia Labanca é obreira das letras que vai arrumando na escolha das palavrase na exaltação delas. Na amizade que dedica às palavras faz a preservação do território inalienável de liberdade e de usufruto do prazer. Não há pulsão de vida sem palavra, seja a da emoção, seja a da razão.

Proclamo esse seu mérito.

O fascínio feminino do claro enigma e da obscura transparência teve o seu lugar bem posto, nessa história nada comum de uma não qualquer mulher, pois o tratamento do teme muito cuidadoso, parece desmentir a suposta modéstia do título: A história comum de uma mulher qualquer.

No texto da novel escritora há a dosagem adequada de inquietação e consolo, no ritual da palavra que exibe o gosto do desafio do simbólico, se mostra e se esconde na forma verbal significante e se entretece na costura sintática dos enunciados.

Quantas páginas, em prosa e verso, existem para exprimir um simples soluço, uma frágil lágrima, um belo sorriso? A palavra escrita prolonga o que é imediato, implícito e expressivo. O leitor que se incorpore à privilegiada confraria de amantes e vassalos da palavra, dessa palavra que une os pensares de Célia Labanca.

 

O Diário de Pernambuco (PE) 8/10/2006

O Diário de Pernambuco (PE) , 08/10/2006