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Artigos

 
  • Machado e Marcantonio

    , em 08/12/2008

    O Brasil está a concluir os registros do centenário da morte de Machado de Assis. Muitos livros editados, muitos artigos publicados, conferências por toda parte, enfoques inusitados ou repetidos, dúvidas realimentadas, tudo como sugerido na obra de um verdadeiro gênio nascido aqui.

  • Cidadão carioca

    Diário de Pernambuco (PE), em 07/12/2008

    Disse na Câmara de Vereadores do Rio, que não desejava minha fala fosse mais do mesmo. Entre os diferentes títulos de cidadania honorária que recebi, por conta de generosas decisões em várias terras, aquele do Rio de Janeiro consignava um caráter muito especial. Por isso, o meu dizer não foi mais palavra sobre o mesmo tema.

  • Azeites e virgens

    Folha de S. Paulo (SP), em 07/12/2008

    No meu tempo, ainda existiam virgens, mas poucas. Pode parecer paródia de uma célebre frase de Machado de Assis, mas é minha mesmo, nascida de uma vulgar meditação sobre o rótulo de diversos vidros e latas de azeite. Não bastando serem virgens, os azeites de agora são “extra virgens”. Um “plus” a mais na imaculada confecção dos azeites.

  • Negro de óculos

    Zero Hora (RS), em 07/12/2008

    A discussão sobre cotas está de volta (esses dias, na tevê, os ex-ministros da Educação Paulo Renato e Cristovam Buarque debateram a respeito) e, independente das opiniões discordantes – o assunto é mesmo polêmico – tem um mérito: obriga-nos a examinar a questão do racismo na sociedade brasileira. O que me faz lembrar um curioso costume de minha infância, uma espécie de competição entre garotos. Dupla competição, dentro do grupo e também de cada um contra si próprio. O jogo consistia em colecionar mentalmente finais de placas de automóveis. A gente começava pelo zero, depois vinha o um, o dois, o três e assim por diante, até o cem. O notável é que ninguém, a não ser o nosso superego, fiscalizava esta atividade. E, entre nós, mantínhamos uma espécie de lúdico pacto de honra, essas coisas que são raras na vida adulta. Havia, no processo de coletar os números, um curioso detalhe, uma intrigante punição: mesmo que tivéssemos chegado, digamos, ao noventa e nove, teríamos de voltar ao início, ao zero – caso encontrássemos um negro de óculos.***Por que um negro de óculos? Em primeiro lugar, por causa do racismo, por causa do estigma que representava, e representa, a cor negra da pele. Não era esta, contudo, a única razão. Afinal, é praticamente impossível andar por uma cidade brasileira sem encontrar negros. Mas havia o detalhe: negro de óculos.O que era uma coisa rara. E por que era rara? Não é difícil deduzir a razão. Negros quase não usavam óculos. Pobres como eram, e são, não dispunham de dinheiro para isso. Além disso, não teriam, ao menos segundo o raciocínio corrente, motivos para usar óculos. Não freqüentavam escolas; muitos deles eram analfabetos. Ou seja: negro de óculos era exceção.E uma exceção ominosa, suficientemente ameaçadora para ser interpretada como um risco para o nosso jogo dos números. Se os negros começassem a usar óculos, o que aconteceria? Uma subversão completa dos valores então vigentes. Logo estariam freqüentando colégios, quem sabe até universidades. O que seria um espanto, para dizer o mínimo. Na Faculdade de Medicina da UFRGS, que cursei, o número de alunos negros dava para contar nos dedos de uma mão; havia um professor (assistente) negro, mas ele era completa exceção. Atribuía-se a um diretor da faculdade uma frase que dá a medida do preconceito então reinante: “Negro, nesta faculdade, só o telefone”. Naquela época, e isto também é significativo, os telefones – de quem se esperava fossem obedientes servidores, eram obrigatoriamente pretos.***Tem-se afirmado que, com a eleição de Obama (que não usa óculos), chegamos à uma fase pós-racial da História, também anunciada pela diversificação de cores dos telefones.Tomara que seja verdade. Tomara que não tenhamos de voltar para o zero.

  • A popularidade do homem

    O Globo (RJ), em 07/12/2008

    Tenho andado em contato assíduo com Itaparica. Como já lhes contei aqui, arrombaram minha casa e fui obrigado a tomar providências. Creio que não contei que os ladrões não acharam nada para levar, porque, felizmente, nossas pratarias Rochedo e nossos cristais Cica estavam a salvo, na casa de minhas primas Saldanhas. Sim, para não saírem desmoralizados, eles levaram toda a fiação elétrica da casa, imagino que tencionando vender o cobre por peso, sem saber que poderiam obter melhor preço em qualquer museu, já que aquela fiação, ao que sei, deve ser anterior a meu nascimento, ocorrido em meados do século passado, na mencionada casa.

  • A perda silenciosa

    Zero Hora (RS), em 06/12/2008

    Existem órgãos cuja presença podemos facilmente constatar. O coração se contrai ritmicamente, os pulmões inspiram e expiram, a bexiga se enche e se esvazia da urina. Os ossos, não. Os ossos estão ali, quietos. Movem-se, claro, mas não espontaneamente: seu movimento é comandado pelos músculos. Os ossos são humildes servidores.

  • Quem tem medo de Hillary

    Jornal do Brasil (RJ), em 05/12/2008

    O líder, ao contrário do que parece ao senso comum, não é aquele que é movido pelo verbo mandar. Ser líder é muito mais a capacidade de coordenar do que a de impor sua vontade, como o iluminado que determina caminhos. A função de liderar implica ter ouvidos abertos e ouvir sempre, e mais, falar o necessário e buscar a unidade para agir. É certo que a unidade não é clone da unanimidade, mas opiniões, quaisquer que sejam, não devem ser desprezadas. O Marquês de Pombal, iluminista que transformou Portugal como ministro de D. José I, quando indicou seu sobrinho Melo e Póvoas para governar a província de São José do Rio Negro, depois chamada de Amazonas, ao transferi-lo para o Maranhão escreveu-lhe uma carta sobre a arte de governar. São ensinamentos de bom senso que valorizam o ato de mandar, que ele considera muito mais uma tarefa de compor consensos do que de usar da força. Dizia ele que quem governa tem de ter dois ouvidos, um para ouvir o ausente e outro o presente. Que o governante deveria ter espinhos nos ouvidos, para que as coisas não entrassem de uma vez só, ficassem espetadas para serem melhor analisadas.

  • Jackson, consciência católica e reação

    Jornal do Commercio (RJ), em 05/12/2008

    Entre tantas efemérides, nestes dias, de celebração do pensamento brasileiro, de Machado a Guimarães Rosa, marcam-se também os oitenta anos do falecimento de Jackson de Figueiredo, arrebatado por uma onda na Joatinga, antes de sua quarentena. Deu-nos a retomada radical de uma visão do cristianismo na modernidade, no quadro do confronto de fundo, em que a crença saía da boa consciência da ordem e ao mesmo tempo do confronto da fé com a racionalidade progressista do começo do século.

  • Data venia

    Jornal do Commercio (RJ), em 04/12/2008

    Reclamação geral: não se suporta certo tipo de linguagem, como o economês (“valor agregado”, por exemplo). O internetês é também intolerável (“bj”, “tb” etc.). Sem falar na mais antiga de todas, a do juridiquês, consagrada, data venia, nos pareceres e nas sentenças de todos os graus da Justiça.

  • Mulheres e cavalos

    Jornal do Commercio (RJ), em 02/12/2008

    Acácio, o conselheiro, poderia dizer que o avião é necessário para se vencer longas distâncias. Incorporando o espírito de porco do personagem de Eça, eu diria que é perigoso também. Não pela hipótese de um acidente. Entendidos garantem que é o meio de transporte mais seguro do mundo.

  • Respeito aos Direitos Humanos

    Jornal do Commercio (RJ), em 01/12/2008

    É indiscutível que a filosofia ocidental tenha se inspirado, nos seus primórdios, no pensamento dos grandes filósofos gregos. O melhor resultado do convívio das pessoas deu origem a um sistema, chamado democracia (do grego demos = povo e kratos = autoridade), do qual até hoje nos beneficiamos, na busca pretendida do bem comum.

  • O futuro na geladeira

    Folha de S. Paulo (SP), em 01/12/2008

    Um dia ela ainda ingressaria no curso de administração, um dia brindaria a seu futuro; era só questão de esperar.

  • A era do Ego

    Zero Hora (RS), em 30/11/2008

    A historinha tem origem desconhecida, mas vale a pena contar.Um escritor, vaidoso como costumam ser alguns escritores, está conversando com um amigo. Fala non-stop sobre seu tema preferido: ele próprio.Fala, fala, até que de repente dá-se conta de que aquilo não é justo.– Só falamos de mim – diz – vamos falar um pouco de você.E pergunta:– O que você acha da minha obra?

  • Velhotes municipais

    O Globo (RJ), em 30/11/2008

    Como se sabe, ter uma bela qualidade de vida na velhice depende fundamentalmente de se ter uma péssima qualidade de vida na juventude e na maturidade. Nenhum relacionamento com comida, por exemplo, pode ser prazeroso e livre, mas fiscalizado com desconfiança.

  • A revolta da natureza

    Folha de S. Paulo (SP), em 28/11/2008

    O homem, para lembrar uma velha expressão de Lévi-Strauss, é o maior vilão da natureza. Ele a modifica, degrada, abusa e chega a criar a perspectiva de destruir a própria vida com as armas nucleares e o aquecimento global, em nome do progresso que parece caminhar para o suicídio.