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O risco do PSDB

 

O PSDB, que nasceu em junho de 1988 de uma dissidência do PMDB, na época dominado por Orestes Quércia, governador de São Paulo, o principal expoente da ala fisiológica do partido, hoje, encontra-se preso a uma contradição de sua própria história, pois não consegue desvencilhar-se de uma aliança carcomida com o próprio PMDB, envolvido, como quase sempre, em acusações de corrupção e fisiologismo político, depois de ter vivido uma história de resistência e luta contra a ditadura em que políticos como Ulysses Guimarães e Tancredo Neves davam o tom do partido.

Com a indecisão de sair ou não do governo, o PSDB está correndo o risco de ser humilhado por Michel Temer e ser retirado do governo em troca de cargos para os partidos aliados. Corre o risco de um dia abrir o olho e acordar fora do governo por vontade do Temer. Apático, o partido perdeu o “timing” de sair do governo, pode morrer afogado com Temer e, ainda pior, pode ficar na humilhante situação de ser rejeitado pelo governo.

Com tudo isso, o partido perde o significado, a identidade e a razão de ser. Qual é o projeto do partido hoje? Ficar no governo? Ter um bom candidato para 2018? Desta maneira, não vai conseguir nada. Essas angústias racham o partido, e o último lance dessa divisão profunda foi a escolha do deputado Paulo Abi-Ackel para fazer o relatório oficial de apoio a Temer, ele que fora dos dois únicos deputados da bancada tucana de sete a votar a favor de recusar o processo contra Temer.

As digitais do senador Aécio Neves, presidente afastado do PSDB, podem ser encontradas nessa manobra política que desmoralizou a posição majoritária no partido de abandonar o governo Temer. Majoritária mas não decisiva, pois entre os tucanos há a busca obsessiva pelo consenso, que gera, contrariamente, divisões profundas.

Como não há mais dúvidas sobre a inconveniência da permanência de Aécio Neves na presidência do partido, arma-se nos bastidores uma disputa nem tão surda quanto gostariam, entre o senador Tasso Jereissati e o governador Marconi Perillo. Nessa disputa, uma outra está subentendida, a da escolha do candidato à presidência da República em 2018.

O senador Jereissati tem o apoio da maioria dos caciques e ganhou a simpatia dos chamados “cabeças pretas”, os jovens parlamentares e prefeitos que querem decisões mais agudas, como a saída do governo, como defende o presidente interino. O apoio a Perillo vem de Aécio Neves, que se contrapõe aos dois candidatos potenciais paulistas, o governador Geraldo Alckmin e o prefeito João Dória, que apoiam Jereissati.

O governador de Goiás, que sonha há muito ser candidato à presidência da República, vê nessa disputa interna a chance de se cacifar para enfrentar os paulistas que, no entanto, têm o controle do maior eleitorado do partido, que deu a Aécio Neves em 2014 uma frente de cerca de 7 milhões de votos no Estado.

A pressão para que o partido decida logo sua nova direção e uma posição de autonomia diante do governo Temer, apoiando as reformas mas preferencialmente não com cargos no governo, levou a que se marque para agosto a reunião para eleger a nova Executiva.
Tudo indica que os jovens tucanos terão força para influir decisivamente na retirada do governo, com o apoio da ala paulista. Na prática, Alckmin e Dória são as melhores opções hoje para o PSDB, e têm características que se encaixam bem na disputa que virá. Alckmin é o típico político conservador que transmite uma sensação de equilíbrio que está fazendo falta nessas ofertas de candidaturas apresentadas aos brasileiros no momento.

Se conseguir esclarecer favoravelmente as denúncias de que recebeu R$ 10 milhões de caixa 2 da Odebrecht, onde era identificado com a alcunha de Santo nas planilhas de propinas, e outras denúncias de corrupção que envolvem alguns de seus principais assessores, o governador Geraldo Alckmin é o favorito para ser o candidato do partido.

O prefeito João Dória, seu protegido, tem característica oposta, mas também muito útil na campanha que se avizinha: é um político aguerrido, que escolheu uma marca forte para se identificar com os eleitores paulistas: o antipetismo, o antilulismo.

Travado pela lealdade a Alckmin, mas claramente disposto a se apresentar como alternativa mais viável do PSDB, Dória aguarda sua vez com atitudes ousadas e polêmicas, que têm ajudado a vender sua imagem de gestor moderno pelo país. É claramente o único fenômeno político que surgiu nos últimos tempos, e por isso mesmo corre o risco de misturar sua imagem com a do então candidato Fernando Collor.  Um risco calculado que ele administra no limite máximo.

O Globo, 15/07/2017