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Decisão equivocada

 

O Supremo Tribunal Federal, assumindo o protagonismo mais uma vez, decidiu que qualquer brasileiro preso em cadeias degradantes merece uma indenização do Estado. A decisão unânime veio à propósito de um preso do Mato Grosso do Sul, e tem repercussão geral, isto é, terá que ser seguida por todas as instâncias do Judiciário.

Só houve uma discordância entre os ministros: três deles votaram por uma redução de dias de cadeia como forma de indenização ao preso, enquanto os sete outros foram a favor da indenização pecuniária, que prevaleceu. Não há dúvida de que, na essência, o pleno do STF está certo.

O Estado é responsável pelas condições em que os presos se encontram, e assim como pode ser processado em caso de morte, já que o preso está sob sua custódia, também as situações degradantes de nossas prisões podem provocar danos irreparáveis que têm que ser indenizados.

A péssima situação dos presídios e das cadeias brasileiras não é uma novidade, mas ficou em exposição ampla em dias recentes por causa das revoltas em presídios em vários Estados do país, onde cenas aterrorizantes foram mostradas através das redes sociais para quem estivesse disposto a encarar essa triste realidade.

Mas, diante da situação econômica do país, a decisão do Supremo Tribunal Federal parece no mínimo insensata. A corrida pelas indenizações já deve ter começado, e o Estado brasileiro simplesmente não tem condições de fazer frente a esse gasto adicional. Há informações de que já existem vários presos e pessoas de suas famílias dando procuração para a abertura de processos contra o Estado, um prejuízo bilionário aos cofres públicos.

A redução das penas, e os mutirões carcerários que o Conselho Nacional de Justiça promove de vez em quando seriam soluções mais adequadas para melhorar a situação das cadeias e dos presídios.

Ficar contra a decisão do STF não quer dizer que considere que atribuir ao Estado a responsabilidade por seus presos esteja errada. Só não vejo nessa decisão uma preocupação dos ministros com a sua viabilidade. Seria mais efetivo se o Supremo desse um prazo fixo para que o Governo tome providências para tornar as cadeias do país menos degradantes.

Além disso, a decisão do Supremo abre brechas para que se procurem indenizações por serviços públicos não prestados, ou prestados de maneira deficiente, pelo Estado. E é o que não falta. Os hospitais públicos não funcionam adequadamente, os transportes públicos igualmente, as escolas públicas são precárias e de má qualidade.

É evidente que o governo de turno é responsável pela não prestação dos serviços que teoricamente pagamos com nossos impostos, mas pedir indenização genericamente por essas falhas inviabilizaria os governos.

A decisão do Supremo tem a qualidade de chamar a atenção mais uma vez das más condições de nossos presídios, mas cria mais um problema quase insolúvel para um Estado que tenta recuperar-se de uma profunda crise econômica.

O Supremo, que em várias ocasiões, como nos julgamentos de planos econômicos, levou em consideração pragmaticamente a situação do país, desta vez não levou a realidade em conta em sua decisão.

Ou, ao contrário, afrontado pela trágica realidade de nossos presídios, decidiu sem avaliar as consequências.

O Globo, 19/02/2017